segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, Marçal Aquino



Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios (Companhia das Letras, R$ 34,00)  me conquistou pelo título incomum e extenso, uma oração completa. Entrou na minha lista de desejos em 2012 e na minha estante após a bienal, mas, só agora em dezembro é que tive a oportunidade de lê-lo. E que oportunidade! Marçal Aquino ganhou uma fã devota!

Sinopse da Companhia das Letras: No momento em que começa a narrar os fatos de Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, o fotógrafo Cauby está convalescendo de um trauma numa pensão barata, numa cidade do Pará prestes a ser palco de uma nova corrida do ouro. Sua voz é impregnada da experiência de quem aprendeu todas as regras de sobrevivência no submundo - mas não é do ambiente hostil ao seu redor que ele está falando. O motivo de sua descida ao inferno é Lavínia, a misteriosa e sedutora mulher de Ernani, um pastor evangélico.

A trajetória do fotógrafo, dado a premonições e a um humor desencantado, vai sendo explicada por meio de pistas: a história de Chang, fotógrafo morto num escândalo de pedofilia; o mistério de Viktor Laurence, jornalista local que prepara uma vingança silenciosa; a vida de Ernani, que tirou Lavínia das ruas e das drogas no passado. Mesmo diante de todos os riscos, Cauby decide cumprir seu destino com o fatalismo dos personagens trágicos. "Nunca acreditei no diabo", diz ele. "Apenas em pessoas seduzidas pelo mal."

É um livro tão curto (232 páginas) que diz tanto que tenho até receio de me estender sobre ele e desmerecê-lo.

A história é narrada por Cauby, um fotógrafo profissional que vai morar numa cidade do Pará, cuja população está envolvida em conflitos com uma mineradora. Lá conhece Lavínia, uma mulher bonita e misteriosa por quem se apaixona e tem um caso. Lavínia é casada com o pastor da igreja local, além disso, sofre transtornos de personalidade e é pura lascívia.

Abaixo, um excerto da primeira vez do casal:


Ela me abraçou e encostou a cabeça em meu peito, bem em cima do meu coração atropelado. E falou apertando as minhas costas:
Entra em mim.
Olhei para a porta do quarto: lá dentro nos esperavam os lençóis enrugados da cama arrumada com pressa e imperícia. Lavínia notou que eu olhava para o quarto e abriu meu cinto.
Sussurrou:
Aqui.
Foi igual adentrar um território sabendo que ele tem dono: com curiosidade e medo. Uma invasão. Lavínia livrou-se das sandálias e deixou que eu a despisse. Depois, tirou as minhas roupas. E acabamos no chão, sobre o tapete. Ela por cima.
Antes de mais nada, porém, o inferno das nossas obsessões. Ela levantou-se e me olhou de um jeito estranho. Achei que tinha mordido seu lábio com furor excessivo. Não era isso: Lavínia tirou a aliança e jogou dentro da bolsa. Disse:
Um pouco de decência não faz mal a ninguém.

(Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, p. 38)



Não é uma narrativa recheada de acontecimentos e floreios, é uma história que poderia ser real, a história de uma paixão arriscada, que teve um final inusitado, ainda que meio trágico.  A narrativa de Aquino aproxima o leitor. Cauby informa logo de cara que algo de ruim vai acontecer com ele, mas conta sua história como se fosse um amigo distante, nos deleitando aos poucos com detalhes de sua infância, de sua vida profissional, seu relacionamento conturbado e ardente com Lavínia, a história da vida da moça e as consequências dessa paixão embriagante.

Considero esse livro uma obra-prima da literatura brasileira contemporânea. Marçal de Aquino, em momento algum põe a narrativa a perder, não deixa lacunas abertas na história, desenvolve a tensão com maestria. A linguagem é direta, sem rodeios e delongas, mas é viciante e poética. Aquino sabe o que faz, escreve com domínio total. Abusa da ironia e das metáforas de um jeito refinado, é a veracidade da narrativa, nua e crua, que prende o leitor durante todo o tempo.

Sem dúvida, minha melhor leitura em muitos anos.

2 comentários:

Luciano A.Santos disse...

Aléxia, não conheço nada do Marçal Aquino, mas tal qual voê o título do livro me chamou a atenção. É mesmo muito difícil falar sobre livros que nos dão tanto,a gente se sente meio incapaz, meio sem saber o que fazer.

Este entrou pra lista.

Aléxia Roche disse...

O título é tão lindo quanto o livro! Leia sim! :D